Brasil, país do passado
por Ipojuca Pontes em 26 de fevereiro de 2007
Resumo: "Brasil, um país do futuro" nos dá conta também da nossa vida cultural nos anos de 1940, bem como da nossa prosperidade econômica e da perspectiva histórica, longe da brutalidade, da indigência e da demagogia ideológica que se apossou da Nação.
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Em 1941, quando do lançamento em várias partes do mundo da primeira edição de "Brasil, um país do futuro", o seu autor, Stefan Zweig, jamais poderia imaginar que suas previsões otimistas viessem a se transformar numa espécie de praga de madrasta ruim jogada sobre o costado da nação brasileira - cujo porvir permanece, desde então, como uma eterna promessa que nunca se concretiza.
O escritor austríaco, fugindo de uma Europa conflagrada pelos regimes totalitários e sangrentos do comunismo, nazismo e fascismo, encontrou pouso no Brasil e, nele, afirma no livro, viu-se diante de um Éden tropical onde prevaleciam, a um só tempo, a tolerância, a harmonia, a beleza e o bom viver e conviver. Sim, éramos, então, uma promessa para esboçar sobre a face da terra uma nova civilização humana e pacífica.
Mas hoje, para a desgraça geral, passados 67 anos das previsões alvissareiras feitas por Zweig, e confrontados os modos de existir do Brasil de ontem com os do Brasil de hoje, só nós resta admitir que o único futuro do "nosso" país seria voltar ao passado, o passado de Zweig – este sim, generoso, humanamente rico e feliz. Vejamos como o escritor austríaco viu o Brasil, no início dos anos de 1940:
- "Para nós (europeus), que experimentamos em nossas próprias vidas as conseqüências terríveis da avidez e da sede de poder, essa forma (brasileira) mais mansa e suave de vida é um benefício e uma felicidade. Claro, não estamos mais dispostos a reconhecer um ranking de acordo com o poder industrial, financeiro ou militar de um povo, e sim usar como medida da superioridade de um povo o espírito pacifista e humanitário. Nunca a paz no mundo se viu ameaçada por sua política, e mesmo em tempos de incertezas como os nossos não se pode imaginar que esse princípio básico de seu pensamento nacional, esse desejo de entendimento e conciliação alguma vez pudesse mudar. Pois essa postura humanitária não tem sido a mentalidade casual dos diferentes governantes. É o produto natural de um caráter popular, da tolerância inata do brasileiro, comprovada ao longo da história. Nesse sentido – a meu ver o mais importante – o Brasil parece-me ser um dos países mais exemplares e amáveis do mundo".
Vitima da intolerância racial nazista, o historiador, biógrafo e romancista austríaco, de inicio ficou encantado com a democracia racial então prevalecente. Diz ele:"Enquanto, no velho mundo, prevalece a loucura de se querer criar pessoas de "raça pura", como se fossem cavalos de corrida ou cães, a nação brasileira se baseia há séculos unicamente no principio da mistura livre e sem entraves, a total equiparação entre brancos e negros, morenos e amarelos.
Existe a igualdade civil na vida pública e na vida privada. Aqui a noção da fraternidade existe visivelmente no espaço real: nas escolas, repartições, nas igrejas, nas profissões e no exército, nas universidades e nas cátedras. É comovente ver crianças de todas as epidermes voltando das escolas abraçadas, e tal união física e espiritual atinge os níveis mais elevados, as academias e cargos estatais. Por isso, o experimento ‘Brasil’, com sua negação completa de qualquer diferença de cor e de raça, em seu êxito visível trouxe uma importante contribuição no sentido de eliminar um desvario que gerou mais discórdia e desgraça para o nosso mundo do que qualquer outro".
Por outro lado, no plano da organização da sociedade Stefan Zweig nos faz uma revelação extraordinária e indica, com clareza, porque tanto regredimos ao virulento estado atual: "Todas as contradições, mesmo no campo social, são significativamente menos acentuadas e, sobretudo, menos envenenadas. A política com todas as suas perfídias, ainda não é o eixo da vida privada nem o centro de todo pensar e sentir. Involuntariamente, respiramos aliviados por termos escapado do ambiente sufocado do ódio de classe e racial para esta atmosfera mais humana".
Não há dúvida: mesmo com a "ditabranda" do Dr. Getúlio o Brasil era mais tranqüilo, melhor e viável. No plano diplomático, por exemplo, longe dos arroubos belicistas e sectários de Celsinho Amorim, Samuca Pinheiro Guimarães e Marco Aurélio Garcia, sempre serviçal ao desvairado anti-americanismo tramado no Foro de São Paulo, a visão do austríaco é precisa: "A geração de grandes estadistas como Rio Branco, Rui Barbosa e Joaquim Nabuco soube de modo particularmente feliz combinar o idealismo democrático norte-americano com o liberalismo europeu dentro da única monarquia da América, realizando de maneira calma e perseverante aquele método de conciliação, de tribunais e de acordos, que é tão honroso para a política brasileira".
Por sua vez, no plano ético, os costumes eram bem menos permissivos e degradantes: "A família, aqui, ainda é o sentido da vida e o verdadeiro centro dinâmico do qual tudo parte e para o qual tudo retorna. Todos vivem juntos e são unidos, durante a semana, no grupo familiar mais íntimo, mas sobretudo aos domingos, quando se inclui o grande círculo de parentes".
"As classes mais diferentes se tratam umas às outras com uma educação que nos surpreende. Vemos dois homens se encontrando na rua e se abraçando. Pensamos que são irmãos ou amigos de infância, um dos quais acaba de chegar de uma viagem exótica. Mas na outra esquina vemos de novo dois homens se cumprimentando da mesma maneira, e compreendemos como o abraço entre os brasileiros é um hábito totalmente natural, fruto da cordialidade".
"Brasil, um país do futuro" nos dá conta também da nossa vida cultural nos anos de 1940, bem como da nossa prosperidade econômica e da perspectiva histórica, longe da brutalidade, da indigência e da demagogia ideológica que se apossou da Nação – coisa que iremos levantar na próxima semana.
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