AULA DE POLÍTICA
por Paulo Moura
A chegada do PT, ao poder, é um fato, que veio para ficar. Mesmo que Lula não faça seu sucessor, sua simples permanência, por oito anos, à testa do Estado, e a perspectiva de continuidade, que tem, já permite, à burocracia petista, um grau de penetração, nas entranhas da máquina pública, cujas conseqüências e desdobramentos se farão sentir, por longo tempo. A tecnologia marxista, remanescente na cultura política petista, migrou do modelo de Lênin (assalto violento e rápido, à cabeça do Estado), para o de Gramsci (penetração gradual, nos aparelhos ideológicos da sociedade e do Estado), mas mantém vivas a organização e as técnicas, do profissionalismo militante, que fizeram, do PT, uma máquina de guerra, sem precedentes, na política brasileira.
As oligarquias tradicionais - entranhadas no Estado patrimonialista -, se acostumaram, mal, ao confortável jogo das disputas políticas intra-elites. Seu palco é o dos gabinetes fechados, dos escritórios de lobby, das tribunas parlamentares, das colunas sociais, e, das, hoje, nem tão discretas, casas de encontro, com moças e moços de vida fácil. A regra do jogo é o troca-troca, entre amigos; mesmo, depois de velhos. A única novidade, agregada aos seus métodos limitados, de disputa política, é o uso da publicidade, no horário eleitoral de propaganda gratuita, na mídia, que, sem base social militante e enfrentando um adversário que a tem, é, taticamente, inferior à tecnologia petista.
Não entenderam o jogo do PT, que combina os antigos métodos esquerdistas, de penetração nas organizações sociais, com o uso, inteligente, da mídia e pitadas de populismo. De posse do comando do Estado, em menos de quatro anos, o PT incorporou, à sua tecnologia, os métodos do jogo tradicional das elites oligárquicas. Agregou, com isso, mais superioridade tática, sobre seus adversários. Nem o mais qualificado, dos estrategistas políticos, seria tão criativo.
Os petistas levaram uns escorregões, tomaram seus tombos, mas a vantagem competitiva, que adquiriram, pela criativa combinação, de todos esses recursos, lhes permitiu comprar, no atacado, com o bolsa-esmola, os currais eleitorais das velhas oligarquias. Em seguida, compraram as próprias oligarquias, que não sobrevivem sem votos e sem sanguessugar as tetas do Estado.
No fundo, os petistas têm razão. A maioria - e bota maioria, nisso - dos ex-adversários e, hoje, aliados do petismo no poder, são corrompidos ou corruptíveis. A melhor forma de neutralizá-los é comprando-os. Os petistas, arrogantes que são, e neófitos, no comando de tanto poder, só erraram, por detalhes. Sua fome de poder, seus sentimentos de superioridade e sua sensação de impunidade - justificada, com se vê - são tais, que forçaram a mão, na rapidez e na forma de corromper seus neo-aliados.
Tudo se resumia a uma questão de timing e calibragem, do processo de compra. Com Lula, reeleito e forte, renovaram-se suas perspectivas de poder e a oportunidade para corrigir os erros do primeiro mandato. Hoje, suas condições de compra são melhores e os petistas podem prosseguir, sua penetração, lenta e gradual, no aparato do Estado. De sarneystas a brizolistas, estão todos comprados.
Agora, o petismo parte para conquistar raízes sólidas, no tecido social, de uma nação, politicamente, imatura, cujos segmentos democráticos são, politicamente, frágeis, minoritários e desconhecedores da cultura republicana. O próximo objetivo do PT é roubar as bases eleitorais, do PMDB, nos municípios. O primeiro passo está dado. O resto do serviço virá com o tempo e a continuidade da aliança PT/PMDB. Os pedetistas já viram esse filme. E, pelo jeito, gostaram.
Digo e repito: a menos que uma grave crise econômica force Lula a tomar, a contragosto, medidas econômicas, em prejuízo sensível, ao bolso da maioria, que o elegeu, ele se manterá, com plenas condições de prosseguir, no poder, após esse mandato, de fazer seu sucessor ou de voltar, em 2014. O poder de escolher está em suas mãos e, nelas, deverá permanecer.
As velhas oligarquias decadentes, que, no passado, mandavam seus filhos estudar, na Europa, para adquirirem qualificação e permanecerem à testa do poder e dos negócios dos clãs, estão minguando, tanto mais, quanto mais perdem eleições e o acesso às tetas do Estado. Com os canais de drenagem do dinheiro público, controlados pelo novo sindicalismo de resultados, comerão migalhas e morrerão, à míngua, em alguns anos. Seus herdeiros são jaderes, renans e geddéis; mercadantes, devanires, joãos paulos, mentores, professores luizinhos; aloprados, mensaleiros e sanguessugas. E a oposição estáem frangalhos.
A social-democracia tucana - acadêmica e, geneticamente, murista - ameaça pular, para o lado errado, e se deixar seduzir, pelos flertes do petismo. Os tucanos hesitam em dar combate, ao que pensam ser a materialização de uma versão cabocla, impossível e fora de época, de welfare state, comandado por um ex-operário, que se fez político, nos ombros e pelos cofres do sindicalismo CLT, inventado por Getúlio Vargas, sob inspiração de Mussolini.
FHC ajudou a parir esse ornitorrinco e está atordoado, com o desatino de seus filhotes. Voando, como galinhas, os tucanos conformam-se, com suas disputas intestinas, pelas fatias menores dos poderes que lhes restam. Por enquanto. Nessa batida, seu destino é o limbo do poder. Se perderem São Paulo e Minas, seu breve sepultamento será ao lado do túmulo, das oligarquias enferrujadas. Lula comparecerá ao enterro, levando uma coroa de flores e chorando lágrimas de crocodilo.
Os ex-pefelistas, geneticamente, patrimonialistas, ensaiam os primeiros passos, de uma estratégia de troca do eleitorado ignorante, dos grotões, comprado por Lula, pela classe média, dos pólos modernos da sociedade brasileira. Intuem, corretamente, o rumo da sobrevivência. Mas, o ponteiro nervoso, da sua bússola, ainda não indica, com firmeza, o norte magnético do liberalismo, na política brasileira. Os Democratas largaram na frente, na busca de um rumo, mas seu aprendizado é difícil e seu caminho é longo, muito longo ... Ziguezagueiam, até, na definição do nome da nova legenda. O que dirá, na arte de fazer oposição ao PT, totalmente fora do aparato do Estado e sem uma rede de sindicatos e o apoio da Igreja, para lhes sustentar.
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