I M P U N I D A D E - VERGONHA NACIONAL

É INACEITÁVEL QUE A IMPUNIDADE E A VIOLÊNCIA SEJAM TRANSFORMADAS EM VALORES LEGÍTIMOS DO MORAL NACIONAL*** Não existe democracia onde não existe segurança do Direito com Soberania, Paz Social, Progresso, Integração Nacional e Integridade do Patrimônio Nacional.

20070311

Os terroristas estão aqui?

Os terroristas estão aqui? PDF Imprimir
11 de março de 2007
Por Matheus Machado, de Ciudad Del Este, e Murilo Ramos (*)

A segurança de Mohamed Tarabain Chamas intimida. Para chegar à sala dele, é preciso ultrapassar uma barreira de homens armados com pistolas e escopetas - ÉPOCA contou dez pelo caminho. Nem parece que vamos ao encontro de um negociante, o administrador da Galeria Pagé, prédio comercial de cinco andares e 165 lojas no centro de Ciudad del Este, cidade paraguaia vizinha a Foz do Iguaçu. Pode-se argumentar que a segurança ostensiva é comum nos centros de compra paraguaios. Para quem acabou de chegar do Brasil, o cenário parece dar razão ao governo dos Estados Unidos, país onde Chamas está proibido de entrar. Ele é acusado pelas autoridades americanas de ser responsável pela contra-informação da organização islâmica libanesa Hezbollah - o Partido de Deus - na região que separa Brasil, Paraguai e Argentina, mais conhecida como Tríplice Fronteira.

De acordo com o governo de Washington, a Galeria Pagé, administrada por Chamas, seria uma espécie de ninho do terror islâmico na região. De lá, Chamas faria contatos freqüentes com radicais islâmicos no Irã e no Líbano. Com voz baixa e pausada, Chamas tenta desfazer a má impressão assim que se chega a sua sala. Diz que seu esquema de segurança é proporcional à ineficácia da polícia local. "Temos de dar segurança aos lojistas. Trabalhamos com mercadorias. O dinheiro circula", afirma. Ele e outros oito muçulmanos radicados no Brasil e no Paraguai são acusados pelo governo dos EUA de financiar o terror islâmico. O nome deles aparece em um relatório do Departamento do Tesouro americano, entregue em dezembro do ano passado a autoridades brasileiras, paraguaias e argentinas. De acordo com o documento, Chamas e os demais suspeitos levantariam dinheiro por meio do contrabando, do tráfico de drogas e de armas, da falsificação de dólares e de passaportes. O lucro desses crimes ajudaria a bancar as atividades de grupos terroristas do Oriente Médio.


A Tríplice Fronteira
é ponto de entrada
de contrabando,
pirataria, armas
e drogas
Há muito tempo Washington encara com desconfiança as comunidades muçulmanas de Foz do Iguaçu e de Ciudad del Este e tenta convencer os governos da região de que o terror não é coisa de outro continente. Até hoje não se descobriu nenhuma célula terrorista na Tríplice Fronteira. Ela seria, segundo os americanos, um refúgio para terroristas procurados, onde eles encontrariam abrigo e conseguiriam documentos falsos para viajar. Também seria um dos centros de coleta de recursos para financiar grupos radicais como o Hezbollah, organização fundada em 1982 para resistir à ocupação israelense do Líbano e considerada terrorista pelo governo de países como Estados Unidos ou Inglaterra - o Brasil considera o Hezbollah um partido político e um movimento de resistência. As suspeitas de presença de terroristas na Tríplice Fronteira envolvem não apenas o Hezbollah, mas também organizações como a Irmandade Muçulmana egípcia e até mesmo a Al Qaeda, rede comandada por Osama Bin Laden, que assumiu a responsabilidade pelo ataque às torres gêmeas de Nova York, em 11 de setembro de 2001.

Sabe-se que, em 1995, Khalid Shaikh Mohammed, um dos mentores dos ataques de 11 de setembro, passou cerca de 20 dias no Brasil para visitar integrantes da comunidade muçulmana de Foz do Iguaçu. Lá, teria ajudado a fundar uma entidade beneficente que seria financiadora da Al Qaeda. Capturado no Paquistão, hoje ele está preso na base americana de Guantánamo, vizinha a Cuba. Em 1996, a polícia brasileira descobriu que o libanês Marwan Al Safadi, perito em explosivos acusado de participar em 1993 do primeiro atentado ao World Trade Center, em Nova York, vivia em Foz do Iguaçu. De lá, Safadi fugiu para o Paraguai, onde foi preso e depois extraditado para os EUA.

CATIVEIRO
Mohamad Fayez Barakat, segundo os eua, faz parte da rede de financiamento do Hezbollah. na semana passada, o comerciante foi seqüestrado

Esse tipo de história mostra por que a questão da Tríplice Fronteira foi um dos itens mais sensíveis na agenda da visita do presidente George W. Bush ao Brasil durante a semana passada. Não estava na pauta pública, dominada pelo etanol e pela busca de um acordo energético na área de biocombustíveis. Era, porém, um tema fundamental nas conversas reservadas entre diplomatas dos dois países. A Tríplice Fronteira tornou-se foco das preocupações dosEUA depois dos ataques de 11 de setembro. A posição do governo brasileiro - invariável sob Lula ou Fernando Henrique Cardoso - tem sido negar a presença na região de terroristas e a existência de uma rede de financiamento ilegal de grupos extremistas. As polícias brasileira, argentina e paraguaia acompanham a movimentação de imigrantes muçulmanos na região desde que a Embaixada de Israel em Buenos Aires foi alvejada por um carro-bomba, em 1992, num atentado que matou 29 pessoas e feriu mais de cem. Imaginava-se, na época, que na Argentina já havia uma rede terrorista articulada, fato confirmado dois anos depois num segundo atentado em Buenos Aires, contra a Associação Mutual Israelita Argentina, que provocou a morte de 86 pessoas. Autoridades argentinas já afirmaram publicamente ter indícios de que os responsáveis pelos dois atentados tenham entrado no país pela região da Tríplice Fronteira.

E o Brasil? Estará livre de tragédias desse tipo? As acusações das autoridades americanas fazem algum sentido ou são pura fantasia, movidas apenas pelos interesses geopolíticos dos EUA no Oriente Médio? É verdade que o governo americano está naturalmente inclinado a potencializar o risco de terror em todo o mundo, por isso essas acusações devem ser vistas com cautela. Também é justificável a preocupação do Brasil em evitar a demonização de uma região e de uma comunidade de cerca de 700 mil pessoas, formada em sua maioria por gente respeitável. Mas até que ponto, ao crer que o Brasil seria um porto seguro livre de atentados, não estamos sendo ingênuos?

Para responder a essa pergunta, ÉPOCA conversou nas últimas três semanas com autoridades brasileiras, paraguaias e americanas sobre a suposta presença de bases de apoio ao extremismo islâmico na Tríplice Fronteira. Procurou os nove homens citados no relatório do Tesouro americano, seus parentes e amigos para discutir as denúncias contra eles (leia o quadro na sequência da matéria).

Chamas, o administrador da Galeria Pagé, aparenta tranqüilidade quando comenta as acusações. Recebeu ÉPOCA para conversar e aceitou posar para fotos montado em sua moto. Afirmou não ter nada a esconder. Disse ser um cidadão típico da comunidade árabe. Sobre sua mesa de trabalho, um exemplar do Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos, um aparelho de fax, um telefone fixo, o celular e um computador. Um monitor de vídeo reproduz as imagens do circuito interno de TV da Galeria Pagé. Na sala de reuniões ao lado, há uma máquina de café e uma TV de 29 polegadas geralmente sintonizada nos canais de notícias árabes Al Jazeera e Sirian Channel.

Nascido no Paraguai, Chamas afirma ter vindo com 1 mês de vida para o Brasil, onde se naturalizou. Conta que estudou em colégio católico até os 12 anos, quando a mãe decidiu mandá-lo ao Líbano para adquirir costumes muçulmanos. Foram dois anos de idas e vindas até ele estabelecer-se na Tríplice Fronteira. Chamas diz ser formado em Administração e afirma que trabalhou na loja de calçados do pai em Foz do Iguaçu, até assumir a administração da Galeria Pagé, há 18 anos. Fluente em português, árabe e guarani, ele diz falar os idiomas estrangeiros somente no horário de trabalho. "Nos fins de semana, só converso em português", afirma.

Chamas diz ter três irmãos, nenhum deles seguidor das tradições muçulmanas. Ele próprio diz ser um homem religioso. Sua rotina, segundo seu relato, começa com a leitura dos jornais no café-da-manhã. Depois ele diz recolher-se todo dia durante dez minutos para rezar antes de sair para o trabalho. Nas noites de quinta-feira, afirma freqüentar a mesquita de Foz do Iguaçu, onde ora por cerca de 40 minutos. Eventualmente, diz visitar a mesquita de Ciudad del Este às sextas-feiras. No ramadã, o jejum de aproximadamente 30 dias consagrado ao Alcorão, afirma seguir à risca as proibições da religião muçulmana. Entre as 5 horas e o pôr-do-sol, diz abster-se de água e comida. Para forrar o estômago, diz levantar-se às 4 da manhã, a tempo de um café-da-manhã à base de coalhada, queijos e chás sem açúcar, para evitar a sede depois que o dia nasce. À noite, sopas, saladas, peixes, lasanhas e muitos doces.

NA LISTA NEGRA
Chamas, um dos acusados, mantém um Alcorão (à esq.)
na mesa de trabalho. De sua moto (acima), ele nega
as acusações e pergunta: "Vocês acham que o Hezbollah
precisa de comerciantes paraguaios?"

Em contraste com o pesado esquema de segurança na Galeria Pagé, Chamas diz que faz o percurso sozinho, de moto, na ida e na volta do trabalho. Às 8h30 está no escritório, de onde afirma sair por volta das 15 horas. Em casa, onde mora com a mulher libanesa e os quatro meninos nascidos no Brasil, conta que faz uma refeição rápida e dorme até o fim da tarde, antes de acompanhar Hussein, de 15 anos, à academia. O pai fala com orgulho do filho, hexacampeão paranaense e campeão brasileiro infantil de tae kwon do em 2005. Nos próximos meses, o garoto vai disputar três seletivas para o campeonato pan-americano de tae kwon do, previsto para este ano nos EUA. Acostumado a assistir às lutas do filho, Chamas não poderá acompanhá-lo caso Hussein conquiste a vaga. "Seria uma das maiores alegrias ver meu filho nessa competição. Mas estou proibido de entrar em território americano", diz.


Ele nega todas as acusações feitas pelo governo americano. Diz que não atua na contra-inteligência do Hezbollah. Afirma que não tem contato com a milícia islâmica e nunca transportou dinheiro para o Oriente Médio. Reconhece apenas a simpatia pelo Hezbollah, sentimento que diz ser comum à maioria dos 15 mil libaneses ou descendentes que vivem na região. "O Hezbollah é muito forte financeiramente. Você acha que eles dependem do dinheiro de comerciantes do Paraguai?", pergunta. É verdade que o grupo libanês tem fontes de recursos mais robustas, como os petrodólares iranianos. No rastreamento de remessas de dinheiro da região para o Oriente Médio, porém, o governo americano afirma ter identificado o envio de US$ 150 milhões ao Hezbollah, segundo noticiou o jornal O Globo na semana passada.


O LÍDER?
Assad Ahmad Barakat, segundo os EUA, seria o comandante do Hezbollah na ronteira.
Foi preso pela PF em 2002 e extraditado para o Paraguai

Outro dos acusados pelos americanos, o libanês Mohamad Fayez Barakat, foi seqüestrado na terça-feira 6, em Foz do Iguaçu. Seu carro foi abandonado no meio de uma rua de Ciudad del Este. Amigos de Fayez disseram a ÉPOCA que os seqüestradores pediram US$ 3 milhões para libertá-lo. No dia seguinte, reduziram o valor do resgate para US$ 1 milhão. Antes de ser seqüestrado, Fayez havia se recusado a falar com ÉPOCA. Segundo o governo americano, Fayez, hoje, seria tesoureiro do Hezbollah na região da Tríplice Fronteira. Ele é dono da loja Big Boss, na Pagé, onde são vendidos equipamentos eletrônicos no atacado, e é apontado pela colônia árabe como um dos empresários mais ricos de Ciudad del Este. Fayez é primo do libanês Assad Ahmad Barakat, preso pela Polícia Federal em 2002 e extraditado para o Paraguai, onde cumpre pena de seis anos por envolvimento com organização criminosa e sonegação de impostos. Segundo o governo dos Estados Unidos, Barakat seria o chefe da coleta de recursos destinados ao Hezbollah na região da Tríplice Fronteira. Na semana passada, O Globo publicou trechos de uma carta do líder máximo do Hezbollah, o xeque Hassan Nasrallah, ao clã Barakat. Na carta, Nasrallah agradece a colaboração com o programa da milícia de "proteção dos filhos dos mártires". Tal dinheiro é destinado, em geral, às famílias dos homens-bomba usados em ataques terroristas.


Os nove acusados no relatório do Tesouro americano seriam todos ligados ao clã Barakat. No relatório americano também são denunciados dois irmãos de Assad: Hatim Ahmad Barakat, de 45 anos, e Hamzi Ahmad Barakat, de 48. Segundo os americanos, Hamzi é suspeito de traficar drogas, armas e explosivos e falsificar dólares. De acordo com investigadores brasileiros, ele se mudou de Ciudad del Este para Curitiba, onde seria revendedor de telefones celulares. Os americanos afirmam ainda que o irmão Hatim captaria recursos para o Hezbollah na Tríplice Fronteira e no Chile. Ele foi detido no início de 2006 no Paraguai, acusado de sonegação de impostos, e está em prisão domiciliar em Ciudad del Este. Outro acusado pelos americanos é Farouk Omairi. Ele faria parte de uma rede de narcotraficantes e teria conseguido ilegalmente a cidadania brasileira. Farouk está foragido. Há contra ele um mandado de prisão expedido pela Justiça brasileira por falsificação de documentos.


Além de Chamas, ÉPOCA conversou com mais dois dos acusados. Um é o libanês Saleh Mahmoud Fayad, acusado pelos americanos de trabalhar na contra-inteligência do Hezbollah na Tríplice Fronteira, de arrecadar dinheiro para a milícia e de ter se encontrado com lideranças terroristas no Líbano e na Síria. Ele disse nunca ter se encontrado com lideranças da milícia libanesa. Não quis falar se viajou ou não para os dois países. Fayad afirma que faz remessas mensais de US$ 300 ao Líbano para ajudar sua mãe, de 55 anos, e seu pai, de 64.


Natural de Beirute, Fayad conta que se mudou para o Paraguai com 16 anos. Ele conversou com ÉPOCA na própria Galeria Pagé. Vestia uma camisa azul, calça jeans e meias - durante a conversa, o tênis ficou embaixo da mesa de trabalho, na loja New Pagé. Atrás da mesa, um desenho com caneta hidrográfica do personagem de desenho animado Homer J. Simpson. Fayad atende telefonemas em português, árabe e guarani. Embora diga não saber ler nem escrever em nenhum dos idiomas, maneja com destreza a calculadora e o computador antigo, modelo 386, de tela escura e letras verdes. Negocia principalmente aparelhos de DVD e microsystems, a maioria "made in China", que forram a estante. A seu lado, um técnico em eletrônica conserta os aparelhos trazidos pelos clientes. Ele diz achar graça quando o acusam de ser um operador do grupo islâmico. Usa o mesmo argumento de Chamas. "O Hezbollah tem muito dinheiro. Se eles quiserem, compram o Paraguai. Imagina se nós os financiamos", afirma.


Fayad foi preso pela polícia paraguaia em outubro de 2001, um mês depois do ataque às torres gêmeas de Nova York, sob suspeita de terrorismo. "Fui solto porque não tinham nada contra mim", diz. "Sabe por que eles não têm nada? Porque sou um simples comerciante que estava no lugar errado, na hora errada, com barba na cara." Ao ser preso, Fayad estava na Galeria Pagé diante de uma das lojas de Assad Barakat. Segundo ele, nos nove meses de cadeia não prestou sequer um depoimento. "Não conseguimos provas do envolvimento dele com o terrorismo", afirma Augusto Lima, chefe de Relações Públicas da Polícia Nacional do Paraguai.


O terceiro acusado que aceitou receber ÉPOCA foi Ali Mohammad Kazan, diretor da Escola Libanesa
ALTA VIGILÂNCIA
Interior da Galeria Pagé, vista pelos
EUA como Q.G. do Hezbollah em
Ciudad del Este. Home armados de
escopetas fazem a segurança do local
Brasileira de Foz do Iguaçu. De acordo com Washington, ele seria o sucessor de Barakat no comando político da célula do Hezbollah na Tríplice Fronteira. Também é acusado de levantar fundos para o movimento. "Temos informações de que, no fim de agosto, Kazan ajudou a arrecadar mais de US$ 500 mil para o Hezbollah", disse em dezembro o secretário-assistente do Tesouro americano sobre Financiamento ao Terrorismo, Patrick O'Brien. Kazan seguramente recebeu dinheiro da comunidade árabe de Foz do Iguaçu. Mas, segundo a versão de comerciantes libaneses da cidade, os recursos foram aplicados na construção da escola.


Com mulher e quatro filhos, Kazan passa o dia na escola, um prédio construído em 2001, cuja arquitetura tem evidente inspiração islâmica. Os alunos se vestem como em qualquer colégio, com bermudas e camisetas. Algumas meninas usam xador, o véu que encobre a cabeça. Libanês naturalizado brasileiro, Kazan recebeu ÉPOCA no gabinete da diretoria da escola, uma sala ampla com duas mesas. Não quis dar entrevista sobre o que qualificou como "denúncias mentirosas" do governo americano. Ele é acusado de viajar com freqüência para o Líbano desde 2001, onde receberia orientações diretamente de Hassan Nasrallah, o líder do Hezbollah. "Podem falar o que quiserem, não estou nem aí", afirma Kazan. "Só tenho interesse em saber sobre meu governo, sobre o presidente Lula e sobre o que se passa aqui."


O empresário libanês naturalizado paraguaio Mohamad Youssef Abdallah, de 54 anos, é mais um acusado pelos americanos de ser líder do Hezbollah e um dos principais financiadores na Tríplice Fronteira do movimento islâmico. Segundo as acusações, ele teria levado pessoalmente dinheiro para a milícia libanesa e também recebido ajuda do Hezbollah para manter a estrutura do grupo islâmico na América do Sul. Os americanos afirmam que ele é o verdadeiro dono da Galeria Pagé, e o governo americano bloqueou seus depósitos em bancos nos EUA. Segundo comerciantes de Ciudad del Este ouvidos por ÉPOCA, Abdallah não é mais proprietário da galeria. Ele teria vendido sua parte para construir um prédio com 19 andares no centro da cidade.


O que mais chama a atenção na propriedade de Abdallah é a mesquita xiita localizada à frente do edifício. Ele teria tentado angariar recursos na comunidade árabe para a construção da Mesquita del Profeta Mohammed, mas só teria conseguido doações de objetos como tapetes e cadeiras. Teve de bancar a obra sozinho. Comerciantes libaneses dizem que Abdallah, um sujeito baixo e rechonchudo, vive em constante luta para emagrecer. Todo dia, segundo esses comerciantes, ele vai a uma academia para caminhar numa esteira e nadar. Em fevereiro, ele negou em entrevista qualquer ligação com terroristas: "Não me envolvo com política, houve apenas uma confusão de nomes". Por quatro vezes, ÉPOCA tentou falar com Abdallah. Amigos do empresário afirmam que ele não quer mais falar com a imprensa.

Os EUA dizem
que o Brasil é
displicente. O
Brasil diz que os
EUA exageram

Segundo se queixam as autoridades brasileiras, as acusações dos EUA sobre os supostos terroristas são frágeis e causam danos indevidos à região e às populações que lá vivem. Os responsáveis pelo setor de inteligência financeira afirmam também que as informações repassadas pelos americanos ao Brasil sobre supostos esquemas de lavagem de dinheiro são imprecisas. "Em Ciudad del Este e Foz do Iguaçu há pessoas que mandam dinheiro para o Oriente Médio? Com certeza. E integrantes das comunidades muçulmanas que vivem na França ou em São Francisco (EUA) não mandam?", disse a ÉPOCA Gustavo Rodrigues, presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão do governo federal que centraliza as informações sobre movimentações financeiras atípicas. "As suspeitas levantadas pelo governo americano em relação à Tríplice Fronteira devem ser vistas também como uma forma de justificar os astronômicos gastos com contraterrorismo e o discurso do presidente George W. Bush de que o terror está em toda a parte", disse a ÉPOCA um graduado diplomata brasileiro.


A reação do governo brasileiro causa insatisfação em Washington. "Alguns governos adotaram uma atitude ingênua, tratando a arrecadação de recursos do Hezbollah como inocentes casos de remessas para familiares. Isso dificulta a conversa com esses países sobre a presença de grupos terroristas dentro de suas fronteiras", disse recentemente o secretário-assistente do Tesouro dos Estados Unidos, Patrick O'Brien, em clara referência ao Brasil. "Os argentinos são mais sensíveis ao tema", afirmou um diplomata americano a ÉPOCA. "Eles já sofreram atentado terrorista e sabem que o risco é real." As divergências entre o Brasil e os Estados Unidos ficaram explícitas na visita a Brasília feita há um mês pelo secretário de Justiça americano, Alberto Gonzáles. Na audiência com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, Gonzáles ouviu a reclamação de que agentes policiais americanos estariam tentando obter informações diretamente de Estados e municípios, sem a interveniência do governo federal, como manda o pacto de cooperação antiterrorismo assinado por Estados Unidos, Brasil, Argentina e Paraguai. Gonzáles, segundo o relato obtido por ÉPOCA, não retrucou.


São conhecidas a porosidade das fronteiras brasileiras e a dificuldade que o governo brasileiro tem de controlá-las. Na Tríplice Fronteira, onde há um tráfego intenso entre Brasil, Paraguai e Argentina, a vulnerabilidade é ainda maior. O movimento diário na Ponte da Amizade, que liga Foz do Iguaçu a Ciudad del Este, é de 50 mil pessoas. Do lado brasileiro, há um posto de controle da Receita e da Polícia Federal, mas a fiscalização de veículos e pessoas é feita por amostragem. Há muitos anos, passam pela ponte trabalhadores, turistas, muambeiros, sacoleiros e também drogas, armas e todo tipo de produto contrabandeado e pirateado que vai para as grandes cidades brasileiras.


Esse ambiente de pouco-caso com a lei fica explícito em Ciudad del Este. Lá estão concentradas as atividades comerciais na fronteira, por causa das restrições às importações impostas pelo Brasil e do clima mais liberal do Paraguai. O trânsito no centro da cidade de 350 mil habitantes é caótico. Nas ruas, o espaço é disputado pelo lixo, por mototáxis brasileiros, velhos táxis da marca Toyota, camelôs, barracas inundadas de produtos chineses baratos e bugigangas eletrônicas de todo tipo, além de milhares de pessoas com sacolas em punho. Nas ruas, não é comum avistar policiais. Homens com pistolas e escopetas são mais freqüentes nas galerias comerciais, localizadas em ruas estreitas, onde se concentram as lojas. As galerias contam, quase sempre, com vigoroso esquema de segurança armada.

FORA DA LEI
O centro de Ciudad del Este é um retrato do ambiente de ilegalidade vigente na fronteira: lixo nas ruas, camelôs, produtos contrabandeados e pirateados

É o caso da Galeria Pagé, um prédio de cinco andares encravado em uma rua secundária de Ciudad del Este. Na Pagé, as lojas se concentram nos dois primeiros andares. Os três últimos são usados principalmente como depósitos de mercadorias. O forte dos comerciantes da Pagé é a venda no atacado. É raro encontrar turistas lá. Os clientes mais freqüentes, segundo os comerciantes libaneses, são pessoas usadas por grandes empresários para comprar os produtos expostos na Pagé e revendê-los no Brasil, driblando a fiscalização da Receita Federal. Em troca de uma pequena comissão, eles fazem as encomendas e emprestam suas contas bancárias para o depósito dos pagamentos. No dia em que ÉPOCA visitou a Pagé, havia muita gente sentada no corredor da galeria. Quando o fotógrafo de ÉPOCA apareceu com a câmera, o corredor se esvaziou.


O comércio fez a fortuna dos negociantes de origem libanesa que começaram a se estabelecer na região na década de 70 - quando eclodiu a guerra civil libanesa e começou a construção da usina de Itaipu. Eles se especializaram, no início, em atender às demandas dos operários recrutados para a obra da usina. Depois diversificaram seus negócios. Hoje, a comunidade libanesa da Tríplice Fronteira é estimada em 15 mil pessoas. A maioria oriunda do Vale do Bekaa, região leste do Líbano, de população muçulmana. Na paisagem de Foz do Iguaçu, as escolas e mesquitas são os traços visíveis da forte presença da comunidade islâmica.


É essa combinação de uma comunidade muçulmana numerosa com uma fronteira vulnerável a atividades criminosas que, na visão dos americanos, torna a região uma zona de risco para a proliferação de terroristas. "O excesso de atividades ilegais na região, como tráfico de armas e drogas, é indício da vulnerabilidade local", diz Walter Maierovitch, ex-secretário nacional Antidrogas. Depois dos atentados de 11 de setembro, a Polícia Federal criou um grupo específico para lidar com o terrorismo. Hoje, ele é composto de quatro delegados e 50 agentes. Eles monitoram supostos extremistas islâmicos não só na Tríplice Fronteira, mas em cidades como São Paulo e Curitiba. "O governo brasileiro está se esforçando para combater o terrorismo", disse a ÉPOCA o especialista em grupos islâmicos e terrorismo Magnus Ranstorp, diretor do Centro de Estudos de Ameaças Assimétricas da Escola Nacional de Defesa da Suécia. "Mas todo o esforço que for feito ainda será pequeno. O terrorismo é sofisticado demais. Até os países desenvolvidos têm dificuldade de enfrentá-lo." De acordo com Ranstorp, outros países da América Latina, como Venezuela e Colômbia, também têm um controle frágil nas fronteiras. Países africanos também vêm sendo acusados de abrigar células terroristas. Ranstorp declarou recentemente, porém, que, se fosse terrorista, se esconderia na América do Sul. Segundo Maierovitch, o Brasil deveria criar uma força-tarefa para a Tríplice Fronteira e torná-la alvo de preocupação permanente dos órgãos de segurança. Na era em que o terror também se globalizou, os especialistas adotaram uma máxima: não perca tempo perguntando se um atentado terrorista vai acontecer; tenha certeza de que ele vai e esteja preparado para detê-lo.


FÉ ISLÂMICA
Mesquita de Foz do Iguaçu:
comunidade libanesa começou
a chegar à fronteira na década de
70 e hoje reúne 15 mil pessoas
LINHA DIRETA
Alberto Gonzáles, secretário de
Justiça dos EUA, ouviu rclamação
do governo brasileiro sobre métodos
americanos de investigação


OS SUSPEITOS
As acusações contra os homens citados
no relatório entregue pelo Departamento
do Tesouro dos EUA ao governo brasileiro
MOHAMED TARABAIN CHAMAS, administrador da Galeria Pagé
• ACUSAÇÃO
Trabalharia na contra-inteligência do Hezbollah e teria transportado dinheiro para o Oriente Médio

• O QUE DIZ
"Nunca trabalhei para o Hezbollah, nem tenho contato com eles. Nunca transportei dinheiro para ninguém"

SALEH MAHMOUD FAYAD, comerciante na Galeria Pagé
• ACUSAÇÃO
Seria da contra-inteligência do Hezbollah e teria coletado dinheiro para a milícia em julho do ano passado

• O QUE DIZ
"Acusam sem prova. Não trabalho para o Hezbollah"

SOBHI MAHMOUD FAYAD, preso no Paraguai por sonegação de impostos
• ACUSAÇÃO
Seria oficial sênior do Hezbollah. Teria recebido treinamento militar no Irã e no Líbano e estaria envolvido com falsificação de dólares e tráfico de drogas

• O QUE DIZ
ÉPOCA não conseguiu falar com ele. O irmão Saleh desmente as acusações

ALI MOHAMMAD KAZAN, diretor da Escola Libanesa Brasileira em Foz do Iguaçu
• ACUSAÇÃO
Seria o novo comandante do Hezbollah na Tríplice Fronteira. Em agosto de 2006, teria ajudado a arrecadar mais de US$ 500 mil para enviar à milícia

• O QUE DIZ
"É tudo mentira. Podem falar o que quiser"

MOHAMAD YOUSSEF ABDALLAH, administrador de uma mesquita em Ciudad del Este
• ACUSAÇÃO
Seria o tesoureiro do Hezbollah na Tríplice Fronteira. Estaria envolvido em contrabando, falsificação de passaporte, fraudes com cartões de crédito e tráfico de dólares falsos

• O QUE DIZ
Não quis responder às acusações

HAMZI AHMAD BARAKAT, comerciante na Galeria Pagé
• ACUSAÇÃO
É suspeito de traficar drogas, armas e explosivos, além de falsificar dólares

• O QUE DIZ
Não foi localizado

HATIM AHMAD BARAKAT, preso em regime domiciliar em Ciudad del Este
• ACUSAÇÃO
Seria encarregado de enviar informações e dinheiro para o Hezbollah no Líbano

• O QUE DIZ
Não quis falar com ÉPOCA. Disse que isso poderia complicar sua situação na Justiça

MOHAMAD FAYEZ BARAKAT, comerciante na Galeria Pagé, seqüestrado na semana passada
• ACUSAÇÃO
Também estaria envolvido com o financiamento do Hezbollah na Tríplice Fronteira

• O QUE DIZ
Não quis falar com ÉPOCA

FAROUK OMAIRI, foragido da polícia
• ACUSAÇÃO
Integraria uma rede do narcotráfico. Condenado por falsificação de documentos para obter cidadania brasileira

• O QUE DIZ
Não foi localizado





O TERROR E A TRÍPLICE FRONTEIRA
Desde a década de 90, há suspeitas de que a região da fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai abriga militantes de movimentos extremistas islâmicos
1975
A eclosão da guerra civil no Líbano intensifica a emigração de libaneses muçulmanos para a região da Tríplice Fronteira. Eles são atraídos pela construção da usina de Itaipu
1992
Atentado contra a Embaixada de Israel em Buenos Aires mata 29 pessoas. Suspeitas são levantadas contra militantes do Hezbollah na Tríplice Fronteira
1994
Ataque contra a Associação Mutual Israelita Argentina (Amia) mata 86 pessoas. Os autores, diz a Justiça argentina, foram o Hezbollah e o Irã
1995
Khalid Shaikh Mohammed, um dos mentores dos ataques a Nova York em setembro de 2001, passa cerca de 20 dias no Brasil e visita integrantes da comunidade muçulmana de Foz do Iguaçu
1996
A polícia descobre que o libanês Marwan Al Safadi, acusado de participar do atentado ao World Trade Center, em Nova York, está em Foz do Iguaçu. Safadi foge para o Paraguai, onde é preso e extraditado para os EUA
2001
Os ataques de 11 de setembro da Al Qaeda colocam a Tríplice Aliança no foco do governo dos EUA e da guerra contra o terrorismo declarada pelo presidente George W. Bush
2002
A Polícia Federal prende em Foz do Iguaçu o libanês Assad Ahmad Barakat, acusado pelo Paraguai de ser o comandante do Hezbollah na Tríplice Fronteira
2006
O Departamento do Tesouro dos EUA acusa nove integrantes da comunidade muçulmana da Tríplice Fronteira de participar da rede de financiamento do Hezbollah montada por Barakat

AS FACÇÕES DO TERROR
Os conflitos do Oriente Médio deram origem a vários
grupos radicais. Um deles, o Hezbollah, um partido
no Líbano, tem simpatizantes na Tríplice Fronteira

1 -HEZBOLLAH
O Partido de Deus

Fundado em 1982 para lutar contra a invasão israelense do Líbano, perpetrou ataques contra americanos, bombardeou Israel e é suspeito de ataques contra alvos israelenses na Europa e na Argentina. Financiado pelo Irã, é hoje um partido poderoso no Líbano liderado pelo xeque Hasan Nasrallah

2 - JAMAA AL ISLAMIA
Grupo Islâmico

Originado da Irmandade Muçulmana, o grupo liderado pelo xeque Omar Abdel Al-Rahman tentou derrubar o World Trade Center em 1993. Também foi o responsável pelo ataque que matou 62 turistas em Luxor, Egito, em 1997
3 - AL QAEDA
A Base

O grupo liderado pelo arquiterrorista Osama Bin Laden congrega células espalhadas pelo mundo todo. Formado durante a resistência à invasão soviética do Afeganistão, nos anos 80, é o grupo responsável pelo ataque ao World Trade Center e ao Pentágono em 11 de setembro de 2001, o maior ataque terrorista da História
4 - JIHAD
Guerra Santa

Fundado nos anos 70, é o mais antigo grupo radical islâmico palestino. Age nos mesmos moldes do Hamas, perpetrando ataques suicidas contra alvos civis em Israel
5 - HAMAS
Resistência Islâmica

Defende a formação de um Estado palestino islâmico. Ataca basicamente civis israelenses por meio de terroristas suicidas e é o grupo mais ativo desde a Intifada, revolta palestina do fim dos anos 80. Ocupa o governo da Autoridade Palestina desde o ano passado







Fotos: Marcelo Min/ÉPOCA, Craig Walker/The Denver Post,
Aurea Cunha/Gazeta do Povo/AE, Marcelo Min/ÉPOCA,
Lucas Nunez/Reuters, Marcelo Min/ÉPOCA, Patrick Sison, AP
e Daniel Garcia/AFP





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