Só pensam naquilo
(Publicado no Jornal do Commercio de 27/03/07)
Sergio Ferolla e Paulo Metri
No Brasil, durante décadas, desde 1940, existiu um órgão de governo que
cuidava exclusivamente da política salineira, tendo mudado de nome por
duas vezes, durante sua existência. Chama a atenção que outros setores
tão ou mais relevantes para nossa economia não tenham merecido o mesmo
interesse, sendo suas políticas definidas por órgão de atuação em
múltiplos setores. No entanto, a existência do órgão do sal é
compreendida pela ação política das regiões e seus grupos produtores.
Na fase atual de abertura indiscriminada da economia brasileira, essa
atribuição foi entregue às agências setoriais, estando o petróleo sob a
batuta da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Não pregamos a não
existência de um órgão exclusivo para o setor de petróleo, pois este
setor é extremamente relevante para nossa economia e a sociedade, porem,
a ANP já prepara, de forma autocrática, a realização da nona rodada de
leilões de áreas para produção de petróleo, depois do fracasso da oitava
rodada, quando ela perdeu na Justiça a intenção de limitar a
participação da Petrobrás nos leilões.
De forma compulsiva, como uma idéia fixa, e continuando sem discutir a
suposta atratividade das rodadas, prosseguem na insânia esses agentes da
dilapidação de um patrimônio estratégico, sem atentar para o resultado
danoso já comprovado em alguns países do mundo, como México, Indonésia,
Reino Unido e Argentina, que de exportadores se vêm caminhando para a
dependência do mercado mundial para suprir suas demandas. No caso em
pauta, o nexo político é obtido observando-se que as empresas
petrolíferas estrangeiras são as maiores beneficiárias da perda pela
sociedade do nosso petróleo e compõem a força política impulsionadora
das rodadas.
Como fruto de decisões políticas impatrióticas de 1995 e 1997, nosso
petróleo, produzido por empresas estrangeiras, é drenado para o
exterior, com as reservas nacionais se esvaindo rapidamente, à medida
que o governo continua a privatizar e desnacionalizar as limitadas
jazidas nacionais, através das rodadas de leilões. Além de transferir
imensa riqueza para o exterior, essa exportação acarretará
desabastecimento, no médio prazo.
Lula e Alckmin trocaram farpas na última eleição, com o primeiro
acusando o adversário de ser adepto de um programa radical de
privatizações, pois ele sabia, por pesquisa de opinião, que a sociedade
rejeitava as privatizações desenfreadas do governo FHC. Contudo, nenhum
dos candidatos se ateve a uma questão essencial para o interesse da
nacionalidade, que é a privatização, com simultânea desnacionalização,
do petróleo nacional e que está acontecendo desde 1998 até o presente,
permanecendo a sociedade, como sempre, mal informada.
Se a nona rodada, marcada para o presente ano, vier a ocorrer, Lula terá
realizado um ato execrado por ele próprio, poucos meses antes. Por outro
lado, se suspender essa nona rodada de leilões e as subseqüentes,
permitindo que tão relevante questão seja debatida pelo governo,
congressistas, agentes econômicos, sindicatos, entidades da sociedade
civil, enfim, pela sociedade, o que não ocorreu em 1995 e 1997, quando
mudaram toda a legislação, estará demonstrando seu patriotismo e
coerência com o discurso de esperança que mobilizou a nação brasileira.
Sergio Ferolla, brigadeiro, é acadêmico conselheiro da Academia Nacional
de Engenharia. Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia. São os
autores do livro "Nem todo o petróleo é nosso" da editora Paz e Terra.
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