Vôo cego
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Editorial, Folha Online (*) Desmentidos, esparrelas, tergiversações e recuos têm marcado a atitude presidencial em diversas situações de crise "SE QUEDEN tranquiles". Pronunciada em tom jocoso, e num castelhano menos castiço que o seu português, a frase do presidente Lula inspira tanta confiança quanto as informações de um comissário de bordo numa empresa aérea dirigida por Cantinflas. O chefe do Executivo dedicava-se a desmentir os rumores em torno da saída do ministro da Defesa, seu co-piloto na errática e turbulenta condução da crise aérea brasileira. Assegurou não cogitar de novas mudanças na equipe ministerial. "Tranquiles", portanto, quedem-se os brasileiros. Se houver alguma queda nos próximos dias, não será de ministro, a julgar pelo que diz o presidente; no máximo de um avião ou outro, poderiam acrescentar os espíritos mais aziagos. O destino de um ministro é de todo modo assunto menos preocupante do que a continuidade de um estilo de governo caracterizado pela inapetência administrativa, pela verborragia e pela omissão. A verdadeira trapalhada aeronáutica da última semana não foi o único episódio -embora, talvez, o mais grave até aqui- em que se revelou a incapacidade do governo Lula para traçar linhas coerentes e rápidas de atuação. Perderam-se meses na composição de um ministério medíocre e fisiológico; a tarefa arrastava-se com a modorra típica dos dias de verão, interrompendo-se a toda oportunidade que oferecesse o calendário, pródigo em feriados nessa época do ano. A elaboração do ministério não foi mais morosa que a do Plano de Aceleração do Crescimento, que, depois de anunciado com estrépito, continua sem sair do lugar. O caso não destoa do que ocorreu com o "Fome Zero", que depois de muita verborragia se viu objeto de uma série de recuos, tergiversações, desmentidos e esparrelas. Desmentidos e esparrelas, tergiversações e recuos marcaram a atitude presidencial durante a crise do mensalão. Planos supostamente definitivos são prometidos pelo governo a cada emergência. Foi assim na área da segurança pública, está sendo assim na crise aeroviária. Entre uma crise e outra, há quem se lembre de uma operação tapa-buracos nas rodovias federais ou de um plano de "TV pública" que ninguém sabe ou quer definir com clareza; o anúncio sempre precede a estratégia. Num único ponto, talvez, o presidente tenha mostrado real clareza de propósitos e agilidade executiva: foi na compra do Aerolula. Nas atuais circunstâncias, não se pode acusá-lo de falta de espírito visionário. Piruetas verbais, "loopings" decisórios e cortinas de fumaça em todas as direções constituem entretanto um espetáculo dificilmente capaz de deixar "tranquiles" os cidadãos brasileiros. Que todos apertem os cintos, o piloto não sumiu. Continua sem saber para onde vai e, se algum passageiro lhe perguntar por que haveria de "quedarse tranquile", diante dessa situação, talvez só tenha a ouvir do presidente Lula uma outra frase em espanhol: "La garantía soy yo". |
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